segunda-feira, 25 de novembro de 2013

Fingimentos

A noite instaurada é sombria, e nem a lua ousa manifestar sua luz prateada. O céu escuro é lenta e completamente recoberto por soturnas nuvens negras, que se instalam em toda a vista da minha varanda como maus agouros. Não passa muito tempo e logo desabam do céu gélidos pingos grossos de chuva, que molham a terra fresca e atraem sapos e rãs cujo croar passa a ecoar na madrugada. No entanto, o som é breve, e tanto o ruído da chuva quanto o dos anfíbios logo cessa, deixando-me novamente no mais profundo silêncio. As horas voam enquanto o sono continua a me escapar da mão, acuado com os pensamentos que conseguem abrir caminho para dentro de minha cabeça. Perdido e sozinho na escuridão, só consigo perguntar que teria feito eu para merecer isto.
O desejo que brotava de meu âmago era abrir a porta de vidro e esperar que a chuva caísse sobre mim, levando consigo toda a negatividade junto desses sentimentos ruins. A Razão, no entanto, me puxou para a realidade, me alertando que tomar chuva antes de dormir quando se tem aula no dia seguinte não seria um ato prudente. Minha Razão se recusa a assimilar a ideia de que algumas coisas estão simplesmente fora de seu alcance. A tristeza que não me abandona, por exemplo, e os sussurros que ecoam no escuro quando estou sozinho. Pois embora eu tente não pensar no que o futuro irá trazer, o medo volta a me assombrar e não consigo afastar a sensação de que o pior está por vir. Mas se pelo menos...
...Se pelo menos você soubesse como me sinto!
Indesejada, a Razão persiste em interferir em assuntos que não lhe dizem respeito, e me diz que não tem sentido se arriscar em um jogo que já foi perdido. Ela não entende que na verdade eu queria fingir, ainda que fosse só por um momento. Só por um instante, queria não saber as coisas que imagino, e poder aproveitar cada segundo antes que isso tudo se acabe. Eu queria acreditar, por mais rápido que fosse. Te dar um abraço apertado, te beijar no pescoço e falar baixinho no seu ouvido que sei que vamos dar certo e que somos perfeitos um para o outro. Mas, mesmo eu sei que isso tudo são só mentiras sem sentido. Tentativas idiotas de ver se consigo te trazer de volta pros meus braços saudosos. Já é uma aposta perdida, me diz a Razão. Você e eu nunca seremos nós...
Talvez minha Razão tenha razão. Talvez eu devesse ir dormir agora, na esperança de conseguir no sonho aquilo que a realidade me nega. Talvez as coisas tenham que ser assim mesmo. Talvez você só me ame mesmo como amigo. Acontece que no fundo, eu ainda quero ter esperança. Quero acreditar que podemos ser felizes juntos, e que esses pensamentos ruins são só coisa da minha cabeça. Quero acreditar que você realmente quer estar com... com alguém como eu. Mas eu tenho medo do futuro. Tenho medo do que ele leva embora, e do que ele pode trazer. E me pergunto se algum dia, juntinho do meu amor eu vou poder viver...

quinta-feira, 21 de novembro de 2013

"Vamos pensar positivo!"

Fui andando por aquela rua arborizada sentindo uma brisa fresca contra meu rosto enquanto procurava o número 11. Toquei aleatoriamente um dos seis botões de campainha que ali estavam, e uma voz tornada rouca pelo interfone me disse para entrar. Atravessei uma porta de vidro e entrei por uma outra porta no que parecia uma típica sala de espera. Música de lounge tocando baixo, ventilador fraco girando lento, sofá amassado na parede, revistas variadas espalhadas pela mesinha de centro, pequenos quadros tortos pendurados na parede. Ansiedade e batimentos cardíacos ligeiramente acelerados. Passando a mão excessivamente no cabelo e batendo as unhas ritmadamente no braço de madeira do sofá. De repente, tirando-me de meus pensamentos, uma mulher de baixa estatura chamou por meu nome. Ela tinha o cabelo castanho-claro preso em um rabo de cavalo e usava jeans azul e blusa branca. Devo confessar que à primeira vista, certamente não fui com a cara dela. Ela observava com olhos vagos de peixe morto e tinha um rosto que não se esperava de alguém com o trabalho dela. Acabei relevando, visto que o sorriso e a doçura em sua voz fizeram com que me sentisse menos desconfortável. A moça peixe-morto me conduziu até uma sala no interior da casa, onde sentamos e ela me fez a mais típica das perguntas de primeiros dias. Por trás de seu estoicismo, vi acender em seu rosto uma faísca de interesse, e concluí que minha resposta a havia satisfeito, embora não fosse essa a minha intenção inicialmente. Continuamos a conversar e ela acabou constatando sua admiração pela minha determinação e otimismo de estar lá por conta própria. Me pareceu um tanto ridícula uma admiração superficial como essa, para ser sincero. Aquela mulher definitivamente não tinha noção de com quem estava lidando. Mas então ela fez um comentário afiado e certeiro que me pegou desprevenido. Fiquei sem reação por alguns segundos, em choque com a obviedade do que me havia sido dito e com a minha aparente alienação em relação a isso. Pelo visto, o olhar vago e vazio daquela mulher enxerga coisas que o olho normal não vê! Notando a minha óbvia surpresa, ela apenas se limitou a sorrir silenciosamente de orelha a orelha, como quem dissesse que eu inevitavelmente tornaria a vê-la naquela sala.