domingo, 25 de março de 2012

O laço

Laços. Um nó, uma interligação, uma teia, uma relação. Propósito. Desígnio, intento, deliberação. Laços, e Propósito. Procura-se os laços que unam a si mesmos ao propósito. Haverão? Seria, de fato, frutífera tal busca? Dessa forma, permite-se então a ponderação. A noção de Zygmunt Bauman sobre a liquidez no que se refere à relações humanas tem um sentido inverso ao empregado em economia. A liquidez de uma conta grande no banco torna acessível a transformação de todos os sonhos em concreta realidade. No entanto, o mundo identificado como líquido possui as características de ser maleável, marcado pela ausência de peso e em constante movimento, gerando nos indivíduos uma profunda sensação de apreensão, a insegurança, o que por consequência implica na experiência da realidade como algo incerto, incontrolável e assustador. O ser humano requer um sentimento constante de segurança e proteção. Uma sociedade sem regras claras, sem valores morais e sem limites, o leva ao desespero. Émile Durkheim escreveu sobre isso em sua obra O Suicídio, em que trata do suicídio como uma questão social, procurando estabelecer a forma como ações individuais podem ser resultado do meio social que cerca os indivíduos. Observando taxas de suicídio, conclui que ele pode ser consequência de interações sociais muito fracas, pois o indivíduo sente-se perdido e sozinho. Ao mesmo tempo, pode ser resultado de interações muito fortes, quando os indivíduos preferem destruir a si mesmos a viver sob controle do outro. Por isso, paralelamente ao desejo de segurança, uma das marcas do perído denominado por Bauman como "Pós-modernidade líquida" é um desejo de liberdade, que acompanha a velocidade das mudanças tecnológicas, econômicas, culturais e cotidianas. Assim, esse quadro resulta em desejos conflitantes de estreitar os laços humanos e, ao mesmo tempo, de mantê-los frouxos. Viver em sociedade é viver em rede. Portanto, não há ser humano que não estabeleça laços pois não há ser humano que não viva em sociedade.
Tendo deixado clara a importância dos laços para os seres humanos e para a sociedade, parte-se para a análise da natureza desses laços. Certamente que exemplos não faltam. Exceto alguns casos de laços de mães para com filhos, que não parecem apresentar qualquer traço de comportamento lógico, todos seguem uma linha previsível de desenvolvimento. Deve-se, no entanto, ter a noção clara que o relacionamento mãe-filho não segue a mesma lógica que um relacionamento filho-mãe. Fora essa exceção, quaisquer outros casos de laços são completa e unicamente baseados no interesse de quem os ata. Casamento, amizade, laços familiares, todos são baseados em princípios de um animal fundamentalmente egoísta e, se por algum motivo não o parecem ser, é simplesmente uma inclinação criada e adquirida, ensinada, o sinal mais certo desse egoísmo em atividade. É necessário ressaltar que o conceito de egoísmo é comumente tomado como egocentrismo. O egoísmo é a atitude de um indivíduo que coloca seus interesses em primeiro lugar, enquanto o egocentrismo caracteriza-se pela fantasia de alguém de que o mundo gira em torno de si. Desse modo, seres humanos são invariavelmente egoístas, mas não necessariamente egocentristas, uma vez que lutam para fazer com que os fatos se moldem a seus interesses. Portanto, apesar de não serem sempre capazes de compreender o motivo por trás da importância dos laços, seres humanos obrigatoriamente acreditam 'sentir' que laços são fundamentais. Ao acreditar 'sentir', no entanto, falham em realizar a verdadeira natureza dos laços, partindo do princípio errôneo de que seres humanos podem agir por algum outro motivo que não o interesse próprio.

quinta-feira, 22 de março de 2012

(In)Gratidão

-Você não quer fazer uma oração antes de comer?
-...Obrigado, deus, por essa maravilhosa refeição entupida de gordura feita às pressas num forno de microondas. Obrigado, por esses talheres de prata que ferem incessantemente minha boca mas são elegantíssimos de se usar. Obrigado por nascer nessa bela família emocionalmente e financeiramente estável, para que eu não saiba jamais o que é ter de enfrentar dificuldades verdadeiras e lutar pelo que quero. Obrigado por ser tão bonito que obviamente estive sozinho todo esse tempo porque tenho problemas em assumir relacionamentos. Obrigado por me criar repleto de possibilidades, de modo que certamente terei o desprazer de passar minha vida em um colégio, me formar em uma ótima faculdade e ter um maravilhoso emprego que me impeça de ter tempo para fazer as coisas que gosto. Obrigado, deus, por me dar um corpo charmoso, para que pessoas aleatórias da rua elogiem-no e impeçam meu ego de despencar pelo chão. Obrigado por viver em um mundo pessoas tem que se esconder para se amarem em paz. Obrigado por me cercar de pessoas interessantes à todos os momentos, de modo que sou claramente anti-social por querer ficar sozinho. Obrigado por me dar esses belos olhos, que não transmitem qualquer sombra de empatia e foram treinados para observar a primeira oportunidade de usar os outros como degraus. Obrigado por agraciar todos os dias meus ouvidos com a bela cacofonia dos sons urbanos. Obrigado por todas essas vantagens e qualidades que fazem com que qualquer sofrimento que eu venha a experimentar seja obviamente auto-inflingido. Obrigado pela sorte que eu tenho de odiar ser levado a sério todas as vezes em que decido conversar de verdade com alguém, ou escrever um texto. E, acima de tudo, obrigado, muito obrigado, meu deus, por me fazer tão inteligente.
-...Amém.

segunda-feira, 12 de março de 2012

O tempo

É lento demais para aqueles que esperam
é rápido demais para aqueles que temem
é longo demais para aqueles que sofrem
é curto demais para aqueles que regozijam
mas é eterno para aqueles que amam