segunda-feira, 27 de fevereiro de 2012

Perfeito

Caso não os achemos
naquela noite estrelada
coberta de amores terrenos
cheirando à um'alma molhada

Se não os encontrarmos,
livrar-nos-emos desses fardos
que do bem-estar, nos privou,
foi o que você me sussurrou

Se de fato nos perdemos
se realmente não os veremos
Então de tudo desistiremos
e essa noite amaremos

Dividindo com todos os amantes
dividindo com todos os passantes
esse nosso mundo de romances
de sua beleza não nos tornar ignorantes

Pois provocado por esse mar calgo,
quem poderia sentir algo
que não fosse a mais bela dor
e o mais belo temor
causados por essa nossa razão,
causados por essa nossa paixão
que é o amor

Você me disse então deita
e ama esses amantes imperfeitos
e ama esse nosso céu imperfeito
pois o amor é olhar o imperfeito
e conseguir vê-lo apenas...

sexta-feira, 24 de fevereiro de 2012

...

-Nicholas falou que é pra levarmos o que formos beber ou comer
-Ok
-Ok?
-Ok, porque acabo de descobrir que ainda tenho 40 reais, E QUE SOU RICA!

EU SOU RICA!

quarta-feira, 22 de fevereiro de 2012

A árvore

Certo dia estava passeando por um parque ouvindo música, quando sentei debaixo da sombra de uma grande árvore, enquanto remoía pensamentos e lembranças. Naquele dia, minha vontade era somente ficar ali, debaixo da árvore, com a minha mente e a minha música, imperturbado. Obviamente, não era pra ser. "É mal de amor que você tem, meu filho" foi o que a árvore me disse. Perguntei então o que ela poderia sequer imaginar saber sobre o amor, além das marcas que os bêbados e os apaixonados deixaram em seu tronco. Ela então me disse que o amor era como ela, uma árvore. Que nascia de sementes distraídas brotando ao acaso, e que se também por acaso a morte precoce não as alcança, crescem e tomam força, fugindo do sol e se enraizando no fundo e no subterrâneo. Lá é onde está o que não se deve mostrar, as nossas fraquezas e nossos medos disformes, nossos defeitos e manias, as nossas vergonhas. Lá embaixo é a fonte das horas difíceis do amor, aquelas que ninguém quer ter ou lembrar. Os momentos de deleite são os galhos crescendo em direção a luz do sol, em busca do claro e do calor das boas horas do dia e, acima de tudo, em busca do perigo e da desventura.  É ali onde se revela o que há de melhor de nós, folhas verdes em formas de sorrisos e afagos. A copa da árvore é a boa ventura do amor.
Perguntei então à árvore se ela que tinha inventado essa história de amor e árvore. Ela respondeu que tinha sido obra de um poeta que, assim como eu, havia se sentado debaixo da sombra da árvore, e havia escrito algo mais ou menos assim. No dia seguinte, eu quis voltar ao lugar onde a árvore estava, na esperança de que a inspiração que atingiu o poeta me atingisse também. Ao chegar, me deparei com uma cena desesperançosa. A árvore havia sido cortada. Dei meia volta e caminhei silenciosamente pra casa, pensando no que ela havia me dito, sobre a copa e as raízes do fundo. Pensando que talvez, todo amor seria também um dia cortado, e só sobrariam as raízes, sepultadas em algum buraco escuro no fundo do coração de quem um dia amou. Balancei a cabeça, repudiando esse pensamento negativo. Pensei, então, que certas árvores vivem centenas de anos antes de morrerem.

domingo, 12 de fevereiro de 2012

Domingo

- Eu nem sei se eu quero ir...
Pausa.
Me ocorreu, durante alguns instantes, que sua voz provavelmente tinha saído mais fraca do que ela desejava.
- O quê? ...Pai? Espera, não tô te ouvindo...
Ela pôs no viva voz
- Não, minha filha, viaja sim! Vai se divertir, passear...
Nesse momento, ela virou um pouco o rosto, enxugando as lágrimas que escorriam nas suas bochechas e manchavam a maquiagem que ela havia demorado horas pra fazer. Eu sabia que isso ia eventualmente acontecer. Ela nunca foi muito boa de segurar esse tipo de coisa, mas mesmo assim... que vergonha.
- Tá bom, pai, então eu vou sim...
- O que foi, minha filha? Tá chorando?
- Tô...
- Mas por quê?
Então ela começou, com aquela voz chorosa e quase suplicante, de quem pede uma solução inexistente para um problema.
- Ai, porque é uma viagem que eu não sei se vai ser boa, sabe? E eu tô preocupada...
- Você precisa se distrair, filha, vai sim. Não se preocupa comigo. Eu vou continuar aqui. Não vou a lugar nenhum...
- Tá bom, pai. Então amanhã eu passo aí, tá? Me espera?
- Espero sim.
- Então tá... boa noite, pai. Beijo.
- Beijo.
E ela continuou a chorar. Com a quantidade de álcool que ela havia bebido, eu arriscaria dizer que as lágrimas dela eram feitas de puro álcool. E se eu já não me sentia seguro dela estar dirigindo antes, agora que estava também chorando, eu contava os segundos para quando seríamos atingidos por um caminhão ou algo do tipo. No entanto, os segundos também se aproximavam da hora do segundo round. E o segundo round sempre era o pior de todos, porque era sempre comigo. Cruzei os braços, numa tentativa desesperada de impedir qualquer forma de contato ou comunicação. Porém...
- Tá tudo bem? Disse ela.
- Sim. E com você?
- Bom...
E o meu pesadelo começa em 3...2...1...
- Tava pensando, sabe, nesse negócio da viagem. Eu não sei se vai ser boa, entende? Queria viajar com um monte de preocupações a menos, mas o meu pai, como você já sabe, tá internado, e eu discuti com o Otávio por causa... por causa de que mesmo? Já nem sei mais...
- ...
- O que você acha?
- De quê?
- Do que aconteceu na casa do seu pai.
- Não sei, não presto atenção na conversa alheia (nota-se que eu disse "conversa", mas meu intento era dizer "lavação de roupa suja").
- Mas aquilo não foi particular, foi público.
- Independente disso.
Pausa.
- E o que te incomodou o dia inteiro? Continuava ela.
- Eu estive incomodado de manhã e agora, sem relação um momento com o outro.
- Por que de manhã?
- Dormi menos do que desejava.
- E por que agora?
- Porque você está chorando.
Percebi que falei besteira. Acabaria fazendo-a chorar mais, e eu sairia ainda mais prejudicado. No entanto, contrariando todas as minhas expectativas, ela recompôs-se.
- Isso te incomoda?
- Profundamente
Nova pausa.
- Por quê?
- Você está se envergonhando.
- Como assim?
- Você, uma mulher adulta, está chorando na minha frente.
- Eu não tenho vergonha de chorar na frente do meu filho. De chorar na frente de alguém que eu amo.
Não sei o que eu disse nesse momento, mas acredito que tenha sido algo sobre aprender a lidar com certas coisas nas horas apropriadas.
- Você acha tão insuportável que eu esteja chorando aqui e agora?
- Sim. Acho insuportável o modo como você me obriga a ser cúmplice do seu sofrimento. Insuportável como parece tentar me privar do direito de imperturbabilidade com assuntos que, particularmente, não me interessam.
- Te faz tão mal me ver sofrendo?
- Isso é pura inconveniência.
- Inconveniência? Essa é uma palavra formal, que não se aplica à relação mãe e filho.
Dei uma risada de desdém, alta o suficiente para que ela ouvisse, mas baixa o suficiente para parecer não intencional.
Longa pausa.
- Eu fico realmente surpresa com a sua indiferença, sabe. Você me fala algumas coisas, e eu me agarro à esperança de que você não saiba realmente do que tá falando... mas aí você me diz que sabe, e eu acho isso tão surreal...
- ...
Então o carro entrou na garagem e ela abriu a porta, enquanto falava algo sobre como as coisas não continuariam as mesmas, e de como parecia que eu achava tudo uma 'merda igual'.
- Tchau, ela disse.
- Tchau, até amanhã.

...

segunda-feira, 6 de fevereiro de 2012

                                              SANATÓRIO BROOKHAVEN
                                                          
                                                   Número do caso: 222.
                                                   Data de Admissão: 14 de Fevereiro de 20...
   

   1) Idade:                            x   Abaixo de 18
                                                 Entre 18 e 25
                                                 Entre 26 e 33
                                                 Entre 34 e 45
                                                 Acima de 46

   2) Sexo:                                Feminino
                                            Masculino
   
                                               Casado
                                               Viúvo
                                            x Solteiro

  3) Tem família?    Desconhecido    

  4) Ocupação:   Hmm...              

  5) Hábitos de vida:  ...Isso pode querer dizer qualquer coisa    

  6) Religião:    Ateu       
 
  7) Trazido por quem?:    Madame Mornington, Diretora    

  8) Forma de insanidade: Transtorno de personalidade borderline   

  9) Suposta causa:  Desconhecida, possivelmente predisposição genética       

10) O problema é hereditário?                   x   Sim
                                                                   Não

11) É suicida?                                            x  Sim 
                                                                     Não

12) Representa risco para outros?              x  Sim
                                                                   Não

13) É destrutivo para propriedade alheia?  x  Sim
                                                                 Não

14) Estado de saúde corporal: ...Doente                                                      

15) Marcas de violência?                           x  Sim
                                                                  Não 

Se sim, especificar:   Cortes e cicatrizes (auto-inflingidos, é claro)   


Anotações do médico: Propenso a mudanças de humor repentinas, variando frequentemente de um estado de profunda apatia e melancolia, a um de extrema agitação, responsável pela perturbação do bem-estar geral da Casa. Diz ouvir vozes à noite. Realizou diversas tentativas de suicídio envolvendo objetos cortantes. Acusa todos que se aproximam de serem robôs com uniformidade de pensamento. Conspirou com garotos de rua para assaltar uma igreja e destruir símbolos religiosos. Desenhos e palavras desconexas feitos a giz branco em toda a extensão da parede, o que afirma serem seus poemas e obras de arte. Arrogante frente a opções de tratamento, baseando seus argumentos no fato de acreditar veementemente ser mais inteligente que outros.                                                        

                                                                                                  "Awareness is the enemy of sanity, for once you hear the             screaming... it never stops"