quarta-feira, 28 de setembro de 2011

Tempos Modernos

Nossa geração não teve qualquer Guerra Mundial ou Grande Depressão. Nossa guerra é interna. Nossa depressão é nossa vida.

quarta-feira, 21 de setembro de 2011

Meh [5]

Outro passo. Outro dia. Mais uma desconsiderada e inútil página já desnumerada era virada no livro velho que caía aos pedaços. Só um dedo machucado e sangrando de tanto bater na mesma tecla, esperando que algo acontecesse. Esperando que alguém ouvisse. Outro passo. Outro dia. Só a sombra de uma cadeira, se deslocando de um lado para o outro repetidamente, sem ser movida. Só se moveria no dia que fosse desmontada e destruída, eles diziam. Outro passo. Outro dia. No qual já não era possível sentir o calor do fogo. No qual todas aquelas comidas refinadas servidas em bandejas de prata tinham todas o mesmo gosto de nada. No qual todos aqueles cortes não provocavam qualquer sensação de dor ou remorso. Dias nos quais estar sob o sol ou sob o gelo não fazia diferença. Dias nos quais o sofrimento não mais comovia. Onde o tédio já não surpreendia. Onde ficar só na vontade já não doía. Onde era só mais um porco num chiqueiro, comendo e dormindo, esperando ser finalmente sacrificado algum dia. Nem mesmo promessas ainda atraíam. Só uma longa estrada de terra, rachada pela alarmante ausência de água, seguia indefinidamente além do horizonte. Sem sinais de haver um dia existido vida ali. Sem toca para oferecer refúgio. Sem lago para oferecer alívio. Sem árvore para oferecer abrigo. Só o dia, a estrada, eu, e o abismo. O que se fez presente desde o início da caminhada, e era profundo demais pra ser preenchido. Outro passo, onde os pés descalços se feriam e sangravam na briga com o barro e com as pedras pontudas do chão. Outro dia, onde era só mais um dia, comandado pela inércia do estado de espírito. Comandado pela falta de comando. Outro dia onde só havia o dia, eu, a estrada, e o abismo. Dias onde não havia dia. Outro dia onde só havia eu, a estrada, e o abismo. Dias onde não haviam caminhos. Outro dia onde só havia eu, e o abismo. Outro dia onde só havia eu, e o abismo. Eu, e o abismo. Eu, e o abismo. Eu, e o abismo...
O abismo...
Fim

- Er, isso ficou muito... profundo, Tiago. Mas a proposta era uma redação sobre o seu cotidiano!
- ...Desculpe

Detesto

Detesto gente burra. Só não desejo sua morte pois vocês constituem 94% do planeta. Obrigado, tenham um bom dia.

quinta-feira, 8 de setembro de 2011

O verdadeiro motivo deu não ter parado de escrever

"-Fefa, vou parar de escrever"

"-Por que você vai trazer essa tristeza pro mundo?"

...

Ai... Casa comigo?

quarta-feira, 7 de setembro de 2011

O último ato

Mantenha a ardência na garganta. Segure as lágrimas. Abaixe a cabeça. Faça uma reverência. Guarde todo o ódio e rancor. Sinta-os queimando e consumindo-o por dentro. Marque-os à ferro quente em seus ossos e em sua pele. Não ouse demonstrá-los, mas jamais esqueça. Cabeça erguida. Se chorar, chore em silêncio. Não permita de jeito nenhum que ela ouça. Não responda. Seja um ator. Torne-se uma farsa perfeita. Encarne o personagem. Leve-o para a cama. Não é de seu interesse manter conflitos agora. Não adiantará nada. Sob todos os aspectos, é debaixo da sombra de seus galhos que você permanece no momento. Então guarde seus pensamentos. Escravize sua vontade. Negue seu ego. Corte seu próprio corpo. Lamente que seja pautado no número de canhões à disposição. Em relações simples e puramente políticas. Sinta o remorso de não ser o leve crepitar de uma vela, ou o som de um conjunto de borboletas batendo suas asas. Mas não reclame. Espere. Deixe pra correr atrás de sua sanidade mais tarde. Espere o prato esfriar. Aguente. Não se dê ao luxo de cair aos pedaços. Recomponha-se. Não ouse cambalear. E mais importante:
Faça-a acreditar que a ama.

quinta-feira, 1 de setembro de 2011

Uma última conversa antes de se abandonar a escola

As pessoas sempre reclamam de não ter sapatos até que vêem um homem sem pés, e aí reclamam de não ter uma cadeira de rodas elétrica. Por que? O que as faz se transferir automaticamente de um sistema estúpido a outro, e por que o livre-arbítrio só é usado nos detalhes e não em questões mais amplas? Em vez de "onde devo trabalhar?", por que não "devo trabalhar?" Em vez de "quando devo construir uma familia?", por que não "devo construir uma familia?". Por que não trocamos de país subitamente, de modo que todos na França se mudem para a Etiópia, e todos na Etiópia se mudem para a Grã-Bretanha, e todos na Grã-Bretanha se mudem para o Caribe, e assim por diante, até que finalmente tenhamos compartilhado o mundo como deveríamos e nos despojado de nossa lealdade vergonhosa, egoísta, sanguinária e fanática ao solo? Por que o livre arbítrio é desperdiçado com uma criatura que tem escolhas infinitas, mas finge que são apenas uma ou duas?
As pessoas são como joelhos golpeados com minúsculos martelos de borracha. Nietzsche era um martelo. Schopenhauer era um martelo. Darwin era um martelo. Eu não quero ser um martelo, porque sei como os joelhos vão reagir. É chato saber. Eu sei porque sei que as pessoas ACREDITAM. As pessoas tem orgulho de suas crenças. Seu orgulho as entrega. É o orgulho da propriedade. Todas as visões místicas me parecem muito ruidosas. Todos os mistérios deveriam ser ignorados pois nós os vemos. Mas a maioria acredita no que vê, entende? Elas não enxergam um processo em andamento. Acontece quando as pessoas vêem a morte, e isso ocorre o  tempo todo. Elas vêem a morte mas percebem a luz. Elas sentem a própria morte e dão a isso o nome de deus.
 Isso também acontece comigo. Quando sinto lá no fundo que há um significado no mundo, ou deus, eu sei que na verdade é a morte. Mas como eu não quero ver a morte à luz do dia, a mente confabula e diz: escute, você não vai morrer, não se preocupe, você é especial, você tem significado, o mundo tem significado, você não sente? Eu continuo vendo a morte e também a sinto. E minha mente diz: não pense na morte lalalala você sempre vai ser bonito e especial e nunca vai morrer nuncanuncanuncanunca você nunca ouviu falar da alma imortal? Bom, você tem uma muito boa.
Eu digo talvez, e minha mente diz: olhe este pôr-do-sol incrível, essas montanhas incríveis, olhe esta árvore magnífica! De onde mais isso poderia ter vindo senão da mão de um deus que vai embalar para todo o sempre? Então eu começo a acreditar em pântanos profundos! Quem não acreditaria? É assim que começa. Mas eu duvido. E minha mente diz: não se preocupe. você não vai morrer. Sua essência não vai perecer, não a parte que vale a pena ser conservada. Uma vez todos nós vemos o mundo inteiro de nossas camas. Na minha vez eu o rejeitei. Entende? Todas as vozes vem de dentro. A energia nuclear é uma perda de tempo. Eles deveriam andar por aí canalizando a energia do inconsciente durante o ato de negar a morte. É durante esse processo ardente que a crença é produzida, e se as chamas são mesmo quentes elas produzem a CERTEZA - filha feia da crença. Sentir que você sabe, de todo o coração, quem fez o universo, quem o controla, quem responde por ele, etc. é, com efeito, desvincular-se dele.
Os chamados religiosos, os chamados espiritualistas, os grupos que rapidamente renunciam à tradição ocidental do "consumismo que apazigua a alma" e afirmam que conforto é morte creem que isso só se aplica às posses materiais. Mas se o conforte é morte, isso deveria se aplicar sobretudo à mãe de todos os confortos, a certeza da crença - muito mais aconchegante que um sofá de couro macio ou uma banheira de hidromassagem, e que certamente mata um espírito ativo mais depressa que o controle remoto de um portão elético. Mas é dificil resistir à ilusão da certeza, e por isso você precisa manter um olho no processo, para que, ao ter todas as visões místicas do mundo inteiro e escutar todas as vozes quase sussurradas, possa rejeitá-las logo de cara e resisitir a tentação de se sentir especial e acreditar na imortalidade, pois sabemos que é apenas uma obra da morte. Você entende? Deus é a bela propaganda feita nas chamas do Homem. E tudo bem amar a deus porque você aprecia a maestria de sua criação, mas não precisa acreditar em um personagem só porque ficou impressionado com o autor. A MORTE E O HOMEM, os coautores de DEUS, são os escritores mais prolíficos do planeta. Sua produção é prodigiosa. Juntos, o inconsciente do Homem e a Morte inevitável criaram jesus, buda, maomé, para citar apenas alguns. E estes são apenas os personagens. Eles criaram o céu, o inferno, o paraíso, o limbo e o purgatório. E estes sao só os cenários! E o que mais?
TUDO, possivelmente. Essa parceria bem sucedida criou tudo no mundo, com exceção do próprio mundo. Tudo o que existe exceto o que já estava aqui quando o encontramos. Entende? Você compreende o processo? Os humanos são únicos neste mundo porque, ao contrário de todos os outros animais, desenvolveram uma consciência tão avançada com um terrivel subproduto: são as únicas criaturas conscientes de sua própria mortalidade. Essa verdade é tão assustadora que desde muito cedo os humanos a enterram bem fundo em seu inconsciente. E isso acabou transformado as pessoas em máquinas de sangue quente, fábricas de carne e osso que produzem significado. O significado que elas criam é canalizado em seus projetos de imortalidade - seus filhos, seus deuses, seus trabalhos artísticos, seus negócios, suas nações - projetos que, acreditam, sobreviverão a eles.
E aqui está o problema: as pessoas sentem que precisam dessas crenças pra viver, mas são inconscientemente suicidas por causa delas! É por isso que quando uma pessoa sacrifica a própria vida por uma causa religiosa, ela escolheu morrer não por um deus, mas a serviço de um medo primitivo inconsciente. Portanto, é esse medo que faz com que ela morra da própria coisa de que tem medo. Você vê? A ironia de seus projetos de imortalidade é que, embora tenham sido projetados pelo inconsciente para enganar a pessoas, dando a elas a idéia de que são seres excepcionais e prometendo-lhes vida eterna, o modo como elas se preocupam com seus projetos de imortalidade é exatamente aquilo que as mata. A negação da morte empurra as pessoas para o túmulo.
Só isso.